Na segunda parte da entrevista sobre seu EP, Evandro Fióti fala sobre a parceria musical com Emicida, seu irmão e sócio na criação do Laboratório Fantasma

Em janeiro de 2016, Evandro Fióti iniciou a gravação de seu primeiro EP, um projeto que vinha sendo maturado há pelo menos cinco anos. Em uma entrevista publicada no início do mês, ele detalhou sua trajetória musical – que começou oficialmente no Projeto Guri -, escolha dos músicos e repertório.

Com um trabalho consolidado como empresário de Emicida e vice-presidente do Laboratório Fantasma, ele conta nesta segunda etapa do papo sobre a decisão de trabalhar com a profissionalização da música, enquanto ele mesmo aprendia e se preparava para o desafio de lançar um trabalho próprio. E esclarece: não deixou o sonho pessoal em segundo plano para cuidar da carreira do irmão: “Se eu tivesse continuado no caminho que eu tava, eu ia largar a música. Ele me resgatou pra música através do business”.

Lab: Qual a relação do Emicida com seu disco, além da parceria nas músicas? Ele tem ido a todas as gravações?
Fióti: Faço questão que ele vá. Acho que do mesmo jeito que eu manjo muito mais do business que ele, ele manja muito mais da parte artística do que eu. Então ele tem uma coisa visceral de interpretação. Ele sabe quando uma coisa está emocionante. Isso é crucial pra mim, o momento em que ele chega e diz: “Para nessa música, não coloca mais nada. Já deu”. É uma coisa que ele faz muito bem e é muito difícil você fazer no seu próprio trabalho, precisa de alguém que faça isso por você.

Lab: Você disse que agradece a ele por não ter gravado antes. Como é essa relação entre vocês?
Fióti: Em 2008/9 a gente gravou uma guia e mostrei as músicas pra ele. Ele disse: “Cara, não tá bom, tem que interpretar melhor”. Na hora eu fiquei meio puto, mas depois fiquei com aquilo na cabeça. A gente começou com esse lance do Lab, larguei o McDonald’s, peguei a grana que tinha e ele também pegou a dele e investimos aqui.
Teve um dia e que ele estava contando quantas mixtapes a gente tinha vendido. Eu, empolgado vendo todo aquele corre, disse: “Acho que não quero lançar mais nada, quero ficar no business, tô gostando, vamos profissionalizar”. E ele se sentiu culpado, começou a chorar pra caralho. E eu entendi. Falei que era uma questão de escolha minha, que achava que ia ser legal. Ele falou: “Você me inspirou a fazer esse bagulho”. Eu achei muito generoso da parte dele, porque bem ou mal ele serviu como bode expiatório (risos). Há cinco anos eu não sabia de nada, hoje eu sei tudo. Por isso as pessoas falam: “Você tá fazendo documentário, tá fazendo não sei o que lá, não é muita coisa?”. Não é, porque infelizmente ou felizmente as pessoas não vão ouvir esse disco como se fosse de uma pessoa qualquer. Elas vão me julgar por eu ser irmão e empresário do Emicida. Eu não posso chegar fazendo qualquer coisa.

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Emicida acompanha gravação do EP de Fióti, por Filipe Borba

Lab: Então não existe essa história de você ter desistido da sua carreira para investir na dele…
Fióti: Eu quero deixar isso bem claro: foi uma escolha em conjunto. As pessoas sempre dizem: “Ah, você deixou sua vida em segundo plano pra cuidar do seu irmão”. Não, eu não deixei minha vida em segundo plano, eu digo isso com todas as palavras: se eu tivesse continuado no caminho que eu tava, eu ia largar a música. Ele me resgatou pra música através do business, porque com certeza do McDonald’s eu iria fazer uma faculdade, estava pensando em ser professor de história, e ia sair da música. Não me dediquei a ele à toa, foi uma coisa que eu quis e ele quis. E que ele tem claro na cabeça dele, tanto que ele está feliz com esse projeto. Ele nunca quis que eu largasse, e ele conseguiu isso.

Isso foi uma coisa que foi ficando muito mais clara na minha cabeça depois. Eu achei ótimo não ter feito isso antes, porque eu acompanhei a carreira de muita gente que por se sentir afobada acaba se lançando precipitadamente. Eu ia ter feito essas músicas todas e elas iam ter saído numa versão muito ruim. E elas estão saindo numa versão full HD. E eu acho isso do caralho para um primeiro disco. Embora tenha demorado, eu tô acompanhado de um time de músicos que realmente fazem a cena de São Paulo acontecer, quem faz as músicas mesmo, e pouca gente fica sabendo. E eu achei do caralho que eles quiseram estar comigo nisso. Se eu tivesse feito há cinco anos, poderia ter feito com pessoas legais, mas com músicos inferiores, de outro calibre, o que dá uma baita diferença…

Lab: E se tudo der muito certo, o que muda?
Fióti: Esse é um problema bom… (risos). Mas eu não penso em fazer muitos shows. Minha prioridade vai continuar sendo aqui.
Eu não vou largar o business por isso. Quem me conhece sabe que isso nem me passou pela cabeça. As pessoas estão achando que eu vou virar só artista: não. A não ser que eu vire um Rolling Stones da vida, vire um Caetano Veloso! (risos). Aí eu pago alguém pra ser igual a mim aqui.
Não preciso fazer show pra sobreviver, não preciso entrar na guerra da indústria. Vou fazer o que eu quiser fazer, quando eu quiser fazer. Eu vou devagar, quero fazer show, estou pensando em como fazer, tudo isso está nos planos.
Pensei muito antes de fazer esse disco. Fiquei com vergonha de convidar esses músicos, mas achei que tinha que chamar os caras fodas que eu admiro. Jamais teria chegado neles se não fosse o Emicida. Se não fosse o contato que eu tive com o mercado através dele. É um outro momento, a gente não desenhou, mas o tempo fez questão de arrumar tudo em seu devido lugar, no eixo certo, pra rolar na hora certa.