Beatriz e Gabrielle na sala de desfile da LAB (foto: Moysah)
Beatriz e Gabrielle na sala de desfile da LAB antes da apresentação (foto: Moysah)

Por Camila Oliveira

“É aqui a fila, a gente precisa esperar todo mundo entrar para ver onde fica porque o nosso convite é standing, que é para ficar em pé”, ajuda uma das convidadas. “Deixa eu ver direito. Ah, seu convite é A… é por ali então”, e aponta ela, com certa invejinha, a fila correta para as fãs convidadas por Emicida e o irmão Fióti para assistir ao desfile da LAB na SPFW na última terça-feira (29).

“Não sei o que falar, só sentir. Estou me sentindo muito querida, especialzinha mesmo.” Assim a estudante de design Beatriz Carvalho, 19 anos, do fã-clube Triunfo, passou para a sala de desfiles onde seria apresentada pela primeira vez a coleção “Avuá”. Com ela estava a empresária Gabrielle Campos, 30 anos, do fã-clube Viva pra Noiz. Beatriz não acreditou quando constatou que as duas se sentariam nada menos do que na fila mais especial do evento.

A ansiedade e a expectativa tomaram conta cedo, assim que receberam o convite. “Andava em círculos, não acreditava até contar para a minha mãe e falar com a Gabrielle”, contou Bia, que já sonhou em ser stylist e sempre acompanhou o evento pela TV e pela internet. O som de Emicida ela conheceu aos 13 anos. “A música dele, com a trajetória de alguém que cresceu no mesmo bairro do que eu, negro, com a mesma origem humilde e que me mostrou que posso ser feliz sem me encaixar em um padrão, foi a melhor coisa que aconteceu na minha vida”, contou a moradora da zona norte de São Paulo, cheia de orgulho e autoestima, com um brinco de fita-cassete e a frase “Filha da Rua” escrita nele. “E a Lab traz exatamente isso, mostra que você pode ser quem é.”

Lá fora, antes de entrar no prédio da Fundação Bienal, as duas, que acompanham a marca desde que ela se resumia às camisetas vendidas nas barraquinhas nos shows do rapper, trocavam figurinhas imaginando o que veriam na passarela. Bia apostou nas referências à cultura brasileira e “uma pegada streetwear com charme e elegância”. Gabrielle queria cor: “Eu queria uma coisa mais colorida, porque a ‘Yasuke’ veio vermelha e preta, bem pesada. ‘Herança’ também veio assim, mas com branco e preto, listras e tal. Ia ser demais se tivesse algo mais colorido. Porque ele – Emicida – está usando mais cor, mais rosa, e isso influencia os moleques, acho demais”, disse, com admiração à proposta das peças sem gênero da marca.

Como a coleção foi batizada de “Avuá”, achavam que a música “Avua Besouro [lançada por Emicida em 2010]” seria uma possibilidade para a trilha sonora, mas, entendidas que são de LAB, apostavam mesmo é que o lado criativo e a oportunidade de mostrar uma música nova iriam falar mais alto.

Já na sala, sacolinhas com release e gift no colo, bolsas devidamente acomodadas depois de um “acho que vou colocar no chão, igual a você” para esta repórter, que as acompanhava, a espera das meninas parecia durar uma eternidade. Mas só até começarem a visualizar o batalhão de ídolos no metro quadrado mais cheio de rappers do Brasil. “Olha! É o Rico! Eu amo ele.” Dois segundos depois: “Gente, o Kamau! E o Djonga!”… “Dona Jacira, que linda. Ela fez tanta coisa linda na última coleção. Ela é incrível!”, continuaram, cheias de exclamações: “O Rael está sentado do meu lado. Do meu lado. Meu Deus! Ele é o mais estiloso de todos”, suspira Gabrielle, ao conferir o macacão azul e branco do ídolo.

Apagam-se as luzes. Um azul infinito, repleto de pássaros, invade o espaço e avisa que “Avuá” está na passarela. “Estou arrepiada até a canela!”, sussurra uma delas. “É tão bonito ver todos eles trabalhando juntos em tudo.” Os olhos brilhando e atentos das duas deslizam sobre roupas, modelos e artistas que cantam e contam em versos a proposta da coleção junto da própria trajetória pessoal, que se conecta com a da marca. “Estou segurando para não chorar”, é a frase mais repetida, seguida de “que lindo”. Fotos? “Não consegui. Acho que tirei umas três só, mas estava tão emocionada que devem ter saído todas borradas. Foi tudo muito rápido”, ri Beatriz ao final. As duas ainda teriam um encontro com Emicida no backstage.

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Gabrielle, Emicida e Beatriz no backstage ao fim do show (foto: Moysah)

Passada a emoção de parabenizar o ídolo pessoalmente, as meninas retomam o fôlego e se voltam para o que viram na passarela. “Foi mais do que eu esperava. A coleção toda cheia de cor. Adorei o azul, as calças de moletom com a boca mais larguinha, os bodies todos, tudo mais leve, com menos pano, como eu queria. E os casacos, ai, os casacos”, diz Gabrielle, já escolhendo os seus preferidos. Beatriz elege o body azul com “Ubuntu” estampado como a peça-desejo da coleção e comenta sobre o diferencial da marca. “A gente se vê nas roupas. Não é aquela coisa monocromática com todo mundo igual na passarela.”

Gabrielle é assertiva: “É um reflexo. Quando ele fala que você pode ser o que quiser, você pode ser o que quiser. Está ali. Se você quiser usar um maiô com o bumbum à mostra, vai para o jogo como a modelo mostrou. Se você prefere se tampar mais, coloca um casaco. Ou, igual à menina que entrou com um short masculino no joelho, uma camiseta e um casaco e estava maravilhosa. E a gente esperava o que? Um menino vestindo aquilo. É isso. Cada um usa o que quer e do jeito que quer. Eles acreditam. E fazem a gente acreditar”.

E ela pondera: “Os preços mudaram, mas a qualidade, o corte, o tecido das peças também. Tem gente que fala ‘ah, 300 reais um casaco’. Mas os moleques do meu bairro, lá no Jardim São Luiz, usam tênis de mil reais. Você faz suas escolhas. E tem peças mais em conta, é só escolher, esperar as promoções. Não é porque o Emicida veio da quebrada que ele tem que vender tudo barato. Dá trabalho fazer isso”. Gabi é dona de uma empresa doméstica de T.I. e afirma que se inspira na Lab para os seus negócios. “Quando o Emicida cantou na passarela ‘tipo eu que odeio avião, mas amo ver as nuvem por cima’, logo pensei em quantas coisas nós temos que passar para poder alcançar o que a gente deseja. Mas aí você lembra qual é seu objetivo para ver as nuvens por cima e, para isso, é preciso sair do chão”, completa, “avuando”.

E Bia dá o recado: “A importância da Lab em um ambiente como esse da SPFW é mostrar que a gente está aqui, sabe? Não existe só esse mundinho, existem outras coisas, outra moda. É mostrar que a gente tem o mesmo potencial para estar em um SPFW como para estar em outros países, em qualquer lugar”.